terça-feira, 24 de março de 2009

ESCOLA DA PONTE

A Escola da Ponte, em Vila das Aves, (concelho de Santo Tirso) em Portugal é a escola dos sonhos dos professores comprometidos com a Educação.
O que mais fortemente começou por me impressionar na Escola da Ponte foi a doce e fraternal serenidade dos olhares, dos gestos e das palavras de todos, crianças e adultos. Ali, ninguém tem necessidade de engrossar ou elevar a voz e de se pôr em bicos de pés para se fazer ouvir ou reconhecer pelos demais, porque todos sabem que a sua voz conta e é para ser ouvida. Como as crianças não são educadas para a competição, mas para a entreajuda (e o exemplo vem dos adultos), as pulsões de inveja, ciúme ou rivalidade, e toda a agressividade comportamental que lhes anda associada, estão quase ausentes dos gestos cotidianos dos membros dessa comunidade educativa. Por isso é que na Escola da Ponte não faz sentido falar de problemas de indisciplina, porque todos apoiam todos, todos acarinham todos, todos ajudam todos, todos são afetivamente, cúmplices de todos, todos são, solidariamente, responsáveis por todos. E, não menos significativo, todos sabem o nome de todos, ou seja, todos procuram reconhecer e respeitar a identidade de todos.
A serenidade que espreita nos olhares, nos gestos e nas palavras das crianças não é mais do que o resultado esperado e inevitável do “segredo” da intervenção pedagógica dos profissionais de educação da Ponte. Um segredo feito, simplesmente, de duas palavras e das correspondentes atitudes “meiguice” e paciência”. Parece romântico e fora de moda num tempo em que nas escolas e na sociedade tantas vozes supostamente preocupadas com a agressividade e a indisciplina dos alunos se erguem a reclamar rigorosamente o contrário. Pode parecer romântico e fora de moda, mas a verdade é que a “meiguice” e a “paciência”, na Escola da Ponte, acontecem de uma forma absolutamente espantosa.
Poderão os cínicos de serviço dizer que uma escola de crianças tranqüilas e felizes não é, necessariamente, uma escola eficaz, pois numa sociedade utilitarista que lida mal com as aspirações de felicidade das pessoas, uma escola de crianças felizes é uma escola em conflito e em ruptura com a sociedade que acredita que é preciso ser ditador para ensinar.
Mas a Escola da Ponte não é apenas um ambiente amigável e solidário da aprendizagem. Mais do que uma escola, ela é verdadeiramente, uma comunidade educativa profundamente democrática e auto-regulada. Democrática, no sentido de que todos os seus membros concorrem genuinamente para a formação de uma vontade e de um saber coletivo. Auto-regulada, no sentido de que as normas e as regras que orientam as relações societárias não são impostas ou importadas do exterior, mas as normas e regras próprias que decorrem da necessidade sentida por todos de agir e interagir de uma certa maneira, de acordo com uma idéia coletivamente apropriada e partilhada do que se deve ser o viver e o conviver numa escola que se pretenda constituir como um ambiente amigável e solidário de aprendizagem.
A Escola da Ponte é um exemplo de educação para a cidadania. O civismo não se ensina e não se aprende, ele “entranha-se” pois é da prática que resultam a aprendizagem e a consciência da cidadania.
Tudo o que acontece na Escola da Ponte é, antes de mais nada, “educação na cidadania”: quando as crianças pesquisam, investigam e aprendem em grupo e as “mais dotadas” se responsabilizam pelo acompanhamento e o apoio à aprendizagem das “menos dotadas” e as menos dotadas não sentem constrangimento em pedir ajuda, quando as crianças tem direito a voz nas assembléias e partilham coletivamente suas angústias, seus sonhos, suas dúvidas, suas opiniões, as suas propostas e o fazem sabendo que vão ser escutadas e respeitadas pelos demais... Quando tudo isso e tudo o mais acontece num ambiente amigável e solidário de aprendizagem, a educação na cidadania é o próprio respirar e sentir da comunidade. Aprendi com a Escola que educar na cidadania não é o mesmo que educar para a cidadania.
Acostumada a pensar em escola modelo com um prédio suntuoso, lotada de recursos e programas extravagantes, na Ponte, tudo ou quase tudo parece obedecer outra lógica. Não há aulas. Não há turmas. Não há fichas ou testes elaborados pelos professores para a avaliação dos alunos. Não há toques de campainha, o prédio é de uma simplicidade tão grande que muitos visitantes esperando encontrar uma obra de arte talvez se decepcionem. Mas a filosofia subjacente ao projeto pedagógico daquela comunidade é extraordinariamente simples e belo. Naquela escola o currículo não é o professor, mas o aluno. A educação naquela escola, mais do que um caminho, é um percurso e um percurso feito à medida de cada educando e solidariamente, partilhado por todos. O resto são estratégias, são instrumentos, são meios, intervenções e rotinas processuais.
Não conheço escola que seja fraternalmente tão aberta, tão transparente, tão acolhedora quanto a Ponte. E mais extraordinária ainda, por regra, são as crianças que recebem, acompanham e orientam os visitantes e que procuram dar a primeira resposta ás suas dúvidas. Por tudo isso tomo a liberdade de fazer uso das palavras de Rubem Alves, pois não poderia ser diferente conheci "A ESCOLA COM QUE SEMPRE SONHEI SEM IMAGINAR QUE PUDESSE EXISTIR"

Se quiserem se aprofundar no assunto leiam este livro.

Escola da Ponte - um único espaço partilhado por todos, sem separação por turmas, sem campainhas anunciando o fim de uma disciplina e o início de outra. A lição social; todos partilhamos de um mesmo mundo. Pequenos e grandes são companheiros numa mesma aventura. Todos se ajudam. Não há competição. Há cooperação. Ao ritmo da vida; os saberes da vida não seguem programas. São as crianças que estabelecem os mecanismos para lidar com aqueles que se recusam a obedecer às regras. Pois o espaço da escola tem de ser como o espaço do jogo; para ser divertido e fazer sentido, tem de ter regras. A vida social depende de que cada um abra mão da sua vontade, naquilo em que ela se choca com a vontade coletiva. E assim vão as crianças aprendendo as regras da convivência democrática, sem que elas constem de um programa...

Neuza Maria Penhalves Graziani.

4 comentários:

  1. Neuza, que maravilha está ficando seu Blog, estou muito orgulhosa de ver sua evolução.

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  2. Neuza, Parabens pelo Blog, adorei a sua materia e fiquei admirado com riquezas de detalhes inclusive as fotos.

    Tenho orgulho de ser seu amigo. abraços

    Cosme Medina Junior

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  3. Querida amiga,

    Fiquei feliz em conhecer o seu blog. PARABÉNS pela matéria!

    Abraços,

    Suely Cury

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  4. Gostei muito de conhecer seu blog.
    Quando voltar a Portugal, quero visitar esta maravilhosa escola.
    Parabéns-Admiro sua dedicação pelos ideais da Educação.
    Clarice

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